Segundo a constituição de 1988, “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”, isto é, podemos exercer nossa representação política através da eleição de representantes ou de forma direta por meio de referendos, plebiscitos, audiências públicas etc.
Ao consultar os dicionários, podemos ver que representatividade é a expressão dos interesses de um grupo na figura do representante, que fala em nome do coletivo e está comprometido com a defesa das demandas de quem representa, portanto, temos, aqui, o sentido político e ideológico presente no termo.
A formação dos grupos de interesse, não se dá pela simples adição de seus membros (o todo é mais do que a soma das partes). Parte da formação desses indivíduos, sua identidade, constitui-se, concomitantemente, com a construção da subjetividade presente no grupo formado. O indivíduo constrói/reafirma sua identidade ao se ver pertencente ao grupo, não se trata apenas de delegar sua luta a terceiros, mas se mobilizar a lutar ao perceber que não está sozinho em sua empreitada.
Nas eleições de 2018, elegemos nas diferentes escalas do poder, os representantes de um discurso machista/racista/homofóbico.
“Esse resultado representa a diversidade presente no Brasil?”
Resposta do blog: não. Explico.
Segundo dados do IBGE, em 2018 o Brasil tinha 208 milhões de pessoas, das quais 55% são afrodescendentes e 52% são mulheres. Para estudiosos do tema da sexualidade humana, cerca de 10% das pessoas são “gays” (leia-se não heteronormativo).
A título de explicação e sem considerarmos outras questões, podemos dizer que, no Brasil, o grupo formado por homem/branco/heterosexual é de 20% da população.
“Então, como um discurso representativo de - ‘no máximo’ - 20% da população foi vencedor?”.
Resposta do blog: não há resposta simples, mas podemos inferir.
O presidente foi eleito com 55% dos votos válidos; a soma de votos brancos, nulos e abstenções chegou a 30% do total de votantes. Logo, se o candidato foi eleito com 38,5% dos votos de todos os eleitores aptos a votar, significa que 61,5% dos eleitores não o escolheu como seu representante.
Sem dúvida, podemos dizer que nem todos os indivíduos do grupo homem/branco/heterosexual se veem representados por um discurso machista/racista/homofóbico, também é seguro dizer que - estatisticamente - indivíduos do grupo composto por mulheres, negros e gays votou nesse discurso.
“Não entendi, por que isso acontece?”.
Resposta do blog: novamente, não há resposta simples.
O psiquiatra Frantz Fanon, se debruçou sobre o surgimento e a formação do desejo de identificação com o opressor presente na Argélia colonial. Buscou entender a neurose envolvida no fato de algumas pessoas não perceberem a realidade que os cercam, apresentarem certo nível de alienação patológica.
O discurso do homem/branco/heterosexual como universal, foi histórico e socialmente construído, sendo o desejo de pertencimento a ele tentador. A oportunidade de se respaldar no discurso dominante desperta um sentimento de superioridade em relação ao outro, ao enfraquecido, aquele contra quem irá competir. Como as garantias presente nas leis, não são suficientes para assegurar a todos os cidadãos tratamento igualitário, melhor pertencer ao grupo dominante, ainda que seja um comportamento desviante(?) em relação ao seu grupo de origem, mas condizente ao grupo desejado.
Com a anuência da grande mídia, as eleições de 2018 transformaram-se em plebiscito de apoio ao combate à corrupção. O candidato eleito foi o mais hábil em surfar nessa falsa dicotomia: “quem é a favor da corrupção vota no PT e quem é contra vota em mim.”
O longo histórico de declarações machistas/racistas/homofóbicas do candidato eleito foi ignorado em prol do que se dizia a luta contra a corrupção. Motivos não faltaram para a decepção com o PT, mas a recusa em participar de forma mais ativa na vida política do país criou o ambiente que tornou possível o resultado final.
Na opinião do blog: é preciso investir na reconstrução de nossa capacidade política, enxergar uma potencialidade na adversidade, nas estruturas desse sujeito em sofrimento. Para verdadeiramente libertar-se do opressor é preciso considerar a existência de certo nível de psicose presente em nossa subjetividade, no sentido de carregarmos certas feridas psíquicas, além da demanda que encarregar-se da luta política pressupõe. Não é tarefa simples determinar onde começar a “resistência”, momento no qual recusar-se a ser submetido à vontade de outrem torna-se inescapável. O resultado da “negação” à resistência foi … (o negacionismo?).
Obrigado,
Olhar periférico 09.
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